do Diário de Pernambuco
A Comissão da Verdade de Pernambuco vai pleitear que o governo brasileiro interceda para que dom Helder Camara (1909-1999), ex-arcebispo de Olinda e Recife, seja homenageado com o Prêmio Nobel da Paz post mortem (após a morte), honraria concedida pela Fundação Nobel e o governo da Suécia desde o ano de 1901. O prêmio, jamais conquistado por um brasileiro, seria uma forma de corrigir uma injustiça velada pelo regime militar (1964-1985), que interveio diretamente, via Ministério das Relações Exteriores, para que o religioso não recebesse a honraria. Dom Helder foi indicado quatro vezes, entre 1970 e 1973, e era considerado o favorito pela imprensa especializada na época.
O requerimento para que dom Helder receba a premiação foi feito pelo advogado e membro da Comissão Gilberto Marques, ontem, durante uma audiência do colegiado com o ex-deputado e advogado mineiro Antônio Modesto da Silveira, na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no Recife. “O Brasil precisa confessar a intromissão e as manobras e sugerir à Fundação Nobel que entregue o Prêmio Nobel post mortem. Caso haja ainda hoje um pagamento em dinheiro, que o valor se destine à Fundação dom Helder Camara, voltada para obras sociais”.
A história da intervenção de que o governo das Forças Armadas teria agido diretamente para que dom Helder não recebesse a premiação é antiga, mas até hoje não havia sido apresentado qualquer documento oficial que comprovasse a tese. O diplomata brasileiro Vasco Mariz, no livro Nos bastidores da diplomacia (2003), conta que foram realizadas reuniões, em 1969, a mando do embaixador Jorge de Carvalho e Silva, com membros do corpo diplomático de países como Noruega, Suécia, Dinamarca e Finlândia, para que o religioso não fosse indicado. Multinacionais que atuavam no Brasil, como Volvo, Scania, Vabis, Ericsson, Facit e Nokia, foram convocadas.
Documentos foram obtidos com exclusividade pela Comissão da Verdade de Pernambuco que comprovam a intervenção. “Os documentos são correspondências e troca de informações entre Itamaraty e embaixadas. Um deles mostra correspondências enviadas a instâncias do Vaticano para que elas não dessem importância às denúncias de dom Helder”, disse Manoel Morais, membro da Comissão. O material analisado pelo colegiado foi obtido junto ao arquivo do Ministério das Relações Exteriores em agosto.
Os documentos da comissão, que estão sendo reforçados por cartas e documentos pessoais do arcebispo, reforçam a tentativa do governo em prejudicar a imagem pública do religioso, que ganhou projeção internacional por criticar as torturas e violações do regime contra os direitos humanos. “São documentos de má-fé: uma foto de dom Helder num café conversando com alguém. Estavam produzindo um perfil falso de dom Helder. Ao olhar de hoje, você não acredita que eles foram produzidos pelo estado”, reforça Manoel.
Por Nill Júnior
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